O crente, as festas e as bebidas alcoólicas

louis-hansel-T-6--KGOY6Q-unsplashO uso de bebidas alcoólicas pode sair de moda nos próximos anos, como aconteceu com o tabaco, mas confesso certa decepção com a tolerância de alguns líderes evangélicos. Outros “jogaram a toalha”, desistindo de lutar contra o erro. Eles amargarão à beira do caminho ao perceberem que perderam o bonde da história. Um amigo meu presenciou um debate em sua igreja, quando um pequeno grupo queria que as bebidas fossem algo aceitável. Perplexo, levantou-se e apresentou uma cartilha entregue por um banco comercial aos seus funcionários, a qual alertava e combatia o uso da bebida alcoólica e mostrava a eles os seus inúmeros malefícios.  A assembleia foi encerrada. O irônico é que os pastores que combatem o uso do álcool é que são considerados ultrapassados.

“Não tem nada a ver”, dizem alguns. N.T. Wright lembra que “o pecado, distorcendo e rebaixando capacidades e vocações específicas que Deus nos deu, torna-nos cada vez mais semelhantes em nossa degradação. Jesus, porém, torna-nos cada vez mais vivos em nossa singularidade…”. Precisamos ter alguns pontos definidos, especialmente agora que o mundo ficou ainda mais complexo. Eu sou contra a bebida alcóolica, sou contra a homossexualidade, contra a mercantilização das igrejas, contra a fofoca e contra muitas outras coisas. Os crentes são chamados a enfrentar – sem violência, é claro – o sistema social quando ele se revela pernicioso. Tentar agradar a todos é muito cansativo e é nada funcional, seja no lar, na escola ou no Governo. Não podemos deixar que declarem natural, como estão tentando fazer, aquilo que lutamos para modificar. “Não vos conformeis”, diz Paulo. Não vamos deixar de cuidar da Terra só porque temos o céu garantido. 

Alguns argumentam que não há um mandamento tipo “não beberás um gole de cerveja” e que personagens bíblicos bebiam. Verdade, mas também não há na Bíblia “não tenha escravos”, “não fume”, “não desmate a floresta” e, hoje, lutamos contra isso.  A Bíblia não é uma lista do que podemos e não podemos fazer. Ela oferece princípios para atualizarmos nossas convicções à medida que a realidade vai mudando e que novos conceitos vão sendo validados. No Antigo Testamento, era comum os homens terem duas esposas, mas os cristãos adotaram a monogamia; o Novo Testamento não combateu a escravidão como nós o fazemos hoje; meio século atrás, missionários eram enviados com o lucro do tabaco, mas hoje condenamos o fumo. Algumas vezes, os cristãos passaram a combater o que, até então, era a sua fonte de renda. Estamos evoluindo em alguns pontos. A questão é: se todos seguirem minha interpretação, o mundo será melhor? “Usem a liberdade para servir o próximo com amor. É assim que vocês serão cada vez mais livres, pois o ensino da Palavra de Deus resume-se numa única frase: ame o próximo como a você mesmo. Isso é que é liberdade.” (Gálatas 5.13,14)

Precisamos incluir na balança o fato de que as bebidas alcoólicas de hoje têm um grau de destilação que potencializa o vício e arrebenta os orçamentos públicos, retirando recursos da educação, por exemplo. “Estimativas oficiais indicam que o álcool tira entre 1,3% e 2,7% do PIB do Reino Unido. Nos países pobres, o dano por litro causado pelo álcool é maior – como também é maior entre os pobres do que entre os ricos nos países ocidentais.” (The Economist, traduzido por Terezinha Martinho em O Estadão de 02/01/2020). Não estamos tratando aqui de regras sobre comer e beber; estamos discutindo o que edifica ou destrói pessoas, famílias e sociedades. Sabemos hoje que algumas pessoas não podem experimentar o primeiro gole e sabemos que é na adolescência que muitos são iniciados nos vícios. Oferecer uma dose de qualquer produto viciante, com as informações que temos, é falta de piedade ou de responsabilidade e, se há menores no ambiente, é também um crime. A Lei não permite “vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica”. 

Não excluímos um membro da Igreja porque bebeu uma taça de vinho. Claro que não. Ainda não. Como houve um tempo em que fomos tolerantes com quem fumava ou tinha escravos, enquanto o mundo e as igrejas debatiam o assunto, hoje temos os que ainda defendem o uso de bebidas alcoólicas. Precisamos nos unir aos que combatem com inteligência tudo o que destrói as pessoas e vem, portanto, na contramão dos esforços do Reino. Se alguém pensa diferente da orientação recebida do púlpito,  deve argumentar francamente com o pastor. Entretanto, é grave, religiosamente falando, promover mobilizações por festas mundanas, boates, pirâmides financeiras etc, enquanto o púlpito se esmurra contra (Isso serve também para programas menos condenados, mas que ocorram em horários conflitantes com os programas da Igreja, exceto se a igreja não tem bom senso para equilibrar o calendário de modo a permitir também atividades familiares e de descanso). A ofensa é potencializada pela mistura, como fez o rei Belsazar, das práticas da Igreja com as mundanas. Convidar membros da Igreja para um programa com orações, leituras bíblicas e hinos e, como “sobremesa”, servir bebidas destiladas é quase uma pegadinha.

Devamos amar tão profundamente a Jesus Cristo que o nosso maior desejo seja o de glorificá-lo e honrá-lo em tudo, a despeito das pressões sociais. Enquanto alguns crentes continuam em cima do muro para conquistar a simpatia social, eu quero que o meu estilo de vida honre a Deus, edifique o povo de Deus e ganhe os que ainda não são de Deus.


Veja ainda:

https://juracybahiablog.wordpress.com/2018/06/24/bauernfest-de-petropolis-orgulho-e-tristeza/ 

https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,por-que-beber-alcool-e-algo-que-tende-a-sair-de-moda-em-todo-o-mundo,70003141230